O profissional de Relações Internacionais

29/09/2005 0 Por Rodrigo Cintra
Uma interface com o mundo: o analista de relações internacionais
Desde o fim da Guerra Fria o mundo vem enfrentando profundas mudanças de ordem política e econômica. O avanço das tecnologias permitiu um drástico aumento na velocidade das trocas de mercadorias e informações, fazendo com que as várias sociedades se tornem cada vez mais sensíveis ao que ocorre em pontos distantes do planeta.

A intensidade das comunicações soma-se ao aumento da complexidade das questões mundiais, exigindo um profissional capaz de analisar e agir no dinâmico cenário internacional. Se até então esse desafio era desempenhado por economistas, cientistas sociais, analistas de comércio exterior ou advogados, a necessidade de uma ação mais ampla e capaz de mapear a realidade internacional como um todo criou a demanda por um novo profissional: o analista de relações internacionais.

A forma como se deu essa demanda influencia uma das mais importantes características da formação desse profissional: a erudição aplicada. A formação do analista de relações internacionais é constantemente confundida com uma formação ampla e eclética; no entanto, faz-se necessário perceber que não basta erudição para atuar no mundo de hoje, é necessário também um conjunto de conhecimentos técnicos aplicados que nos permitam desenhar cenários e formular estratégias de ação.

Ao contrário do que podem imaginar algumas pessoas, um profissional de relações internacionais não explica todos os fatos internacionais. A distância de acontecimentos de naturezas diferentes – como é o caso de guerras, integrações econômicas, relações diplomáticas e movimentos transnacionais – faz com que o profissional tenha que escolher apenas uma destas áreas.
Assim como qualquer outro curso, é preciso tomar cuidado para não ser iludido pelo glamour da profissão, geralmente confundida com a diplomacia. Certamente a diplomacia é um caminho possível para este profissional, porém estatisticamente percebe-se que apenas uma ínfima parte dos bacharéis em relações internacionais acaba na diplomacia. A grande maioria é absorvida pela iniciativa privada, com destaque para as áreas comerciais, mídia e organizações não governamentais.

O constante contato com outras partes do mundo faz com que este profissional também tenha que dominar outros idiomas, sobretudo inglês, espanhol e francês. À proficiência das línguas deve ser acrescida a capacidade de rápida adaptação a outras culturas, visto que são constantes as viagens ou mesmo mudanças de países.

Nos cursos de graduação, a carga de leitura tende a ser grande em face da necessidade de capacitar o aluno a perceber grandes tendências internacionais. Outro ponto importante para a escolha desta carreira é a predisposição que o aluno deve apresentar para fazer análises. Em geral, esse profissional deve traçar cenários críticos acerca da realidade internacional e, com isso, sugerir estratégias de ação e por vezes até mesmo executá-las. Isso faz com que o bom profissional de relações internacionais seja aquele com perfil pró-ativo e está sempre disposto a buscar novos desafios.

Uma boa faculdade é aquela que consegue o equilíbrio entre o oferecimento de uma ampla gama de disciplinas e a existência de um eixo temático que consiga dar um sentido a todo o processo de formação. Ainda assim, o profissional de relações internacionais terá que concluir sua formação em um curso de pós-graduação a fim de que alcance o grau de especialização esperado pelo mercado.

 As graduações em relações internacionais estão surgindo em todo o país, aumentando significativamente a oferta de vagas. No entanto, como no Brasil o curso é relativamente recente (à exceção da Universidade de Brasília, que já tem o curso há algumas décadas), não existem profissionais suficientes para ocupar as vagas de docência. Assim, uma das preocupações centrais que o estudante deve ter ao procurar uma faculdade é verificar quanto do quadro de professores é efetivamente formado na área. Se isso parece não ter importância em cadeiras como as de economia e direito, passa a ser decisivo na formação quando pensamos as disciplinas mais específicas e voltadas para a área propriamente dita (negociações internacionais, análise do sistema internacional, política internacional…). 

No que toca à pós-graduação, no Brasil ainda existem poucas que se focam exclusivamente na área de relações internacionais (as principais são as que participam do Projeto Santiago Dantas, do MEC). Isso faz com que surjam duas opções: (1) procurar pós-graduações no exterior, caso em que atentar não só para a faculdade que se escolhe, mas também para o país no qual o curso está inserido já que a formação é dada como um todo; e (2) a escolha de pós-graduações nacionais que não são especificamente de relações internacionais mas que podem complementar a formação, direcionando o profissional para a área de trabalho na qual quer atuar.

O campo de trabalho das relações internacionais ainda está em fase de constituição no Brasil, de forma que ainda encontra-se muita dificuldade e desconhecimento na inserção profissional. Ainda assim, conforme as empresas tomam um primeiro contato com esse profissional, percebem sua importância e não mais deixam de contar com ele dentro de seu quadro de funcionários. Acredita-se que nos próximos cinco a dez anos, a profissão será suficientemente conhecida a ponto de as empresas já terem em seus programas de trainees vagas especialmente dedicadas ao analista de relações internacionais.

Por último, deve-se destacar que os principais lugares de atuação deste profissional são as empresas multinacionais (que necessitam traçar planos estratégicos), as tradings e outras empresas que trabalham com comércio exterior (que têm constantes relações com o exterior), as organizações não governamentais (na elaboração de projetos e captação de recursos) e a mídia (que necessita de analistas de acontecimentos internacionais). 

Rodrigo Cintra é Bacharel em Relações Internacionais  pela PUC-SP,  Mestre em Ciência Política pela USP, Doutorando em Relações Internacionais na UnB, Professor-coordenador do Núcleo de Estudos de Relações Internacionais da Unibero, Vice-presidente da Câmara de Comércio Argentino-Brasileira de São Paulo e Consultor de Relações Internacionais.

Originalmente publicado em:

Estude Comex 2004

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