Políticos salvos, política perdida
01/10/2005Waldomiro Diniz, homem de confiança do ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, viu-se envolvido num escândalo bastante profundo quando pensamos em termos de governo Lula. Em outros tempos, provavelmente o mesmo acontecimento seria tratado com certo desdém, desqualificando o acusado e sua ligação com o poder institucionalizado.
Mas neste caso é diferente. A acusação é a mesma que temos visto na imprensa brasileira desde a época de Collor, quando rastros mal-apagados de passados voltam à tona por questões políticas. O que realmente muda neste caso é a própria política brasileira, que sofreu mudanças (ou ao menos ensaios de) nas últimas eleições presidenciais.
Não podemos nos esquecer que a vitória de Lula/PT não foi por conta de uma crença no seu potencial e ideais. Como já tradicional na política contemporânea brasileira, quem venceu foi a recusa do que até então tínhamos. Assim, elegemos Lula com a esperança de moralizar um pouco a política. Por isso trocamos a idéia de competência administrativa de Serra pela idéia de honestidade de Lula.
Em outras palavras, os eleitores brasileiros não migraram para a esquerda e nem viraram adeptos de um "socialismo light", como demonstram as constantes sondagens de aprovação dos governos petistas nas mais diversas instâncias do governo. Em grande medida a classe média e formadora de opinião continua tão conservadora quanto antes, ainda que tenha buscado alternativas às constantes pressões que vinha recebendo por parte da dinâmica sócio-econômica brasileira.
Assim, quando Waldomiro, o "homem forte" do "homem forte" do presidente é apanhado num escândalo deste tipo, a classe média cada vez mais insatisfeita com os rumos do governo, agora começa a ensaiar suas demonstrações de contrariedade.
Certamente da parte do governo o caso é bastante traumático na medida em que Waldomiro era o articulador do Planalto no Congresso Nacional no tocante aos projetos e reformas constitucionais.
Por mais que o carnaval tenha sido providencial para distanciar um pouco do escrutínio público todo o caso, a oposição já declara que se valerá do escândalo para enfraquecer o governo petista e assim conseguir recuperar parte do espaço perdido nas últimas eleições.
Sem dúvida alguma essa atitude é legítima e até mesmo desejável numa democracia. No entanto, quando olhamos no médio-prazo faz-se necessário ir com um pouco mais de calma. Se colocarmos todos os gatos no mesmo balaio, a democracia brasileira estará perdendo um dos seus melhores momentos.
Os políticos já estão suficientemente desgastados e a idéia de oposição é salutar na medida em que apresenta-se como um contra-peso ao poder institucionalizado. A partir do momento em que ficar claro para a sociedade brasileira que a oposição nada mais é do que um governo que no momento não está governando, a descrença poderá ultrapassar a atual desqualificação das personagens, atingindo o sistema política propriamente dito.
Ou os tempos, ou as práticas mudaram na virada FHC-Lula; caso isso não tenha realmente ocorrido e a sociedade se aperceba, fechem-se as seções de política em jornais e revistas, e o parlamento pois a política definitivamente será um tema enfadonho para os poucos que ainda se ocupam do tema.
Cotidiano: O carnaval foi providencial para acalmar os ânimos no Planalto e preservar a pelo do ministro Dirceu, porém pode não apresentar os mesmos efeitos "benéficos" para a política brasileira.
Moral da História: quando para os políticos tudo é válido, para a política nada é válido.
Conselho Literário:
Os que ainda não forem convencidos desta exposição, ao menos membrem-se dos provérbios do vulgo que não menos se verificam nos Estados do que nos indivíduos: "homem de muitos negócios não será rico", "quem muito abarca, pouco aperta", "quem tudo quer, tudo perde"
Visconde de Cairu
Visconde de Cairu
Originalmente publicado em:
Revista Autor (www.revistaautor.com.br)
Política
Ano IV – nº 33 / Março de 2004