O Congresso e a formulação de política externa

01/10/2005 0 Por Rodrigo Cintra

Para se compreender o processo de tomada de decisões em política externa – que integra os três poderes republicanos –, deve-se atentar para seu aspecto formal. No entanto, a análise do relacionamento entre os poderes deve extrapolar a leitura institucional-legal, sobretudo na medida em que ele envolve também interesses políticos. O estudo deve focar os meios indiretos de ação, bem como os movimentos de ordem política que não deixam marcas formais em suas ações (leis, projetos de leis, audiências públicas, dentre outros).

Alguns dos estudos existentes sobre a participação do Congresso norte-americano nas questões de política externa defendem que o poder Executivo é determinante em sua formulação e que o Congresso participa delas apenas marginalmente. De acordo com essas análises, o presidente exerce o papel central na definição dessa política, dispondo de um conjunto de determinações da Corte Suprema (Supreme Court) como embasamento legal para a execução dessa tarefa. Além disso, os estudos enfatizam que a estrutura institucional do Congresso não seria adequada ao seu envolvimento neste tipo de questã.

Ao se estudar a participação do Congresso nas questões de política externa, é possível constatar que, ao que tudo indica, ela efetivamente se dá numa condição marginal, mais voltada ao apoio às decisões presidenciais do que propriamente formulando propostas concretas. No entanto,

if Congress’s influence over foreign policy resided solely in its ability to legislate its own policy preferences, then we would have our answer [o Congresso tem alguma importância na formulação da política externa dos EUA?]. But focusing on the legislative track record captures only part of the story. Congress influences policy through several indirect means: anticipated reactions, changes in the decision-making process in the executive branch, and political grandstanding. Indeed, the same factors that frustrate congressional attempts to lead on foreign affairs encourage legislators to use indirect means to influence policy. Attention to these indirect means suggests, contrary to the argument made by pessimists, that Congress often exercises considerable influence over the substance of U. S. foreign policy” (Lindsay, 1992-1993: 609).

Além desta forma de participação “indireta”, o Congresso influencia a política externa valendo-se de sua capacidade de veto. Isso significa que ele não precisará necessariamente se pronunciar oficialmente sobre uma questão; a própria constatação de tendências entre os parlamentares pode ser um importante elemento configurador de uma política externa. Verifica-se que, em situações de crise, o poder Executivo se sobressai na formulação e implementação de determinadas políticas em face de seu poder de controle sobre os formuladores e de sua capacidade de rapidamente executá-las. Entretanto, em outros casos, a velocidade da tomada de decisão e a mudança do locus decisório voltam a conferir importância ao Congresso nas decisões de política externa comercial. Assim, “the object is not to pass bills but to use the threat of legislation as a lever with which to pressure the president” (Lindsay, 1992-1993: 612).

No nível institucional, algumas reformas implementadas nas três últimas décadas reduziram o poder dos presidentes dos comitês, que foi transferido para os subcomitês. Ainda que as reformas institucionais de 1994 tenham devolvido parte deste poder àqueles presidentes, verifica-se uma espécie de relacionamento cruzado entre comitês, o que impede a concentração temática em um só deles. Assim, o House International Relations Committee e o Senate Foreign Relations Committee não são os únicos responsáveis pela formulação de propostas de política externa no Congresso, dividindo essa responsabilidade com vários outros comitês.

Ao mesmo tempo, o surgimento de várias agências e órgãos executivos que tratam de questões específicas de política externa (notadamente os comitês de Commerce, Finance, Judiciary, Banking, e Ways and Means) aumenta a complexidade do processo de formulação de política externa e, por conseguinte, a necessidade de compartilhamento do poder com outros níveis.

Deve-se observar que, se nas décadas de 1950 e 1960 o Congresso se comportou de forma subordinada e pouco interessada na formulação efetiva da política externa, a partir da década de 1980 há uma importante mudança nesse perfil, quando então o Congresso passa a adotar medidas que contrariam aquelas defendidas pelo poder Executivo.

 


Originalmente publicado em:

Revista Autor (www.revistaautor.com.br)

Especial CNPq

Ano V – nº 51 / Setembro de 2005

Ano V – nº 51 / Setembro de 2005