Facetas Ingratas da Democracia Formal

30/09/2005 0 Por Rodrigo Cintra

Em tempos de total descrédito na política e, principalmente, nos políticos, os jornais e Brasília ficam em polvorosa cada vez que surge um novo escândalo que pode acabar afetando o destino das eleições de 2002. O governo, ocupa-se em aumentar a popularidade do presidente; a oposição, ocupa-se em encontrar novos casos de corrupção; o cidadão comum, preocupa-se com o emprego e com a qualidade de vida que teima em manter-se ruim para a maioria da população.

A rigor, este período pré-campanha não seria muito diferente de vários outros que já ocorreram no Brasil. Em resumo temos: as elites políticas criam novas articulações entre si e descobrem alguns dos principais anseios sociais; assim, desenvolvem novas linhas argumentativas que buscam atingir o coração dos eleitores. De um lado, a promessa do renascimento, de outro, a promessa da finalização de um projeto inacabado – cuja pior parte já teria passado.

Tudo isso, com maior ou menor esforço pode ser encontrado em nossa história. O que dá um ar de "coisa nova" neste momento é uma forte presença da insatisfação na sociedade. Esta insatisfação é mais profunda quando pensamos no caso do governo, mas ela também é significativa com relação a todos os projetos políticos. Não pode menos, somente um partido (PT) ofereceu um projeto de governo à crítica e mesmo assim não conseguiu uma repercussão social muito grande; em geral, as críticas e elogios resumem-se a membros do governo e da oposição.

Analistas de todas as filiações políticas e matizes enfatizam que a democracia formal que hoje temos é pouco ameaçada pelo cenário político-eleitoral que se avizinha. Ainda assim, o descontentamento da população faz com que surja o voto-negativo. Por isso é mais fácil escutarmos nas ruas "vou votar em fulano porque não agüento mais sicrano" ou "vou votar no candidato de sicrano porque seria uma loucura ter fulano na presidência"…

Esse voto-negativo, depois de balanceado pelas forças conservadoras e progressistas, elegerá o novo chefe da nação. O grande problema é que ele não dá legitimidade social para o governante, que tem que se prender na legitimidade formal (que as eleições lhe deram). Com isso, as tradicionais formas de relação Executivo-Legislativo permanecerão as mesmas – a despeito do aumento das pressões modernizantes na estrutura social brasileira. Enquanto a população brasileira não conseguir se organizar de forma a pressionar os governantes para que observem as condições reais de qualidade de vida geral e, sobretudo, conseguir organizar seu apoio a um determinado projeto político, continuaremos deixando com que a democracia brasileira seja apenas um sistema cheio de significados, mas vazio de conteúdos.


Originalmente publicado em:

Revista Autor

Ano I – N. 1 – julho de 2001