Há líderes que impõem regras claras, metas exigentes e cobram com firmeza. Isso não é, necessariamente, autoritarismo — pode ser apenas rigor. Mas existe um tipo de liderança que atua de forma muito mais sutil, e por isso, muito mais perigosa: aquela que exerce controle constante, disfarçado de cuidado, zelo ou “proximidade”. É o que eu costumo chamar de microautoritarismo.
Esse comportamento não chega com gritos ou ordens explícitas. Ele se instala nos detalhes: nos e-mails copiados desnecessariamente, nas correções públicas mascaradas de “feedbacks”, na centralização de decisões que poderiam — e deveriam — ser delegadas. Tudo sob a lógica da supervisão constante. O líder não grita, mas está sempre olhando. E essa presença silenciosa tem um efeito devastador sobre o psicológico da equipe.
“Medo da liberdade se manifesta no desejo de ser dominado.” Erich Fromm
Erich Fromm nos ajuda a compreender essa dinâmica ao analisar o medo da liberdade. Segundo ele, há líderes que se escondem atrás do controle porque temem a autonomia — não só dos outros, mas principalmente a própria. Eles foram treinados para associar autoridade à vigilância. E, por isso, acreditam que se não estiverem no controle de tudo, perderão o respeito, o cargo ou a própria identidade.
O problema é que o excesso de controle não produz excelência — produz conformismo. Já acompanhei times talentosos virarem apáticos por estarem sob lideranças que, no fundo, não confiavam neles. Os profissionais pararam de propor, de arriscar, de se engajar. Cada decisão, por menor que fosse, precisava passar por um funil invisível de aprovações. E o que era para ser gestão virou sufocamento.
Para quem trabalha nesse cenário, a primeira atitude é se proteger emocionalmente. Quando tudo precisa de autorização, a sensação de incompetência pode se instalar, mesmo sem motivo real. É preciso lembrar que a micromanipulação não é sobre você — é sobre o medo do outro. O microautoritarismo diz mais sobre a insegurança do líder do que sobre a sua capacidade profissional.
Um caminho possível é negociar espaços de autonomia. Comece pequeno: proponha assumir partes de projetos com entregas bem definidas. Construa uma relação de confiança a partir de resultados consistentes. Nem sempre isso será suficiente para mudar o comportamento do líder, mas pode abrir pequenas brechas de liberdade.
Outra possibilidade é formar alianças com colegas que também se sintam cerceados. Grupos informais que compartilham experiências, ideias e suporte emocional ajudam a preservar a sanidade e, muitas vezes, criam pequenas zonas de resistência à lógica do controle. Esses espaços, ainda que informais, têm um papel vital para manter viva a criatividade em ambientes engessados.
Liderar é sustentar a tensão entre o controle necessário e a liberdade desejável. O microautoritarismo rompe esse equilíbrio, transformando o trabalho em um ambiente de constante vigilância. Mas nenhum time floresce quando é observado o tempo todo — porque onde há controle absoluto, não há confiança. E sem confiança, não há liderança verdadeira.