McCain é pró-EUA e não pró-etanol brasileiro

01/07/2008 0 Por Rodrigo Cintra
O etanol brasileiro vive uma boa fase, tanto nacional, quanto internacionalmente. A efetiva consolidação do etanol como um combustível automobilístico depois de décadas de investimentos e esforços produtivos de um lado, o reconhecimento internacional das qualidades ambientais e produtivas do etanol brasileiro de outro, fazem com que depositemos grande parte de nossas expectativas no etanol como um elemento capaz de projetar o Brasil no sistema internacional.

É importante observar que o etanol não é entendido como uma só coisa ao longo do tempo: inicialmente foi concebido como um projeto estratégico governamental voltado à diminuição da dependência brasileira em relação ao petróleo importado; em seguida passou a ser tratado como um produto ecologicamente sustentável e que deveria ser adotado por ser renovável, o que o ligava diretamente com uma questão político-social; e, por último, está sendo transformado numa commodity que deve ter seu espaço no comércio mundial, sem barreiras tarifárias ou técnicas que atrapalhem sua circulação.

Desta forma, na terceira fase do etanol, este passa a ser compreendido como um produto, o que está diretamente ligado à lógica econômico-produtiva. Bem ao contrário, é fácil perceber que existem grandes grupos econômicos travando uma “guerra” para a promoção de seus produtos.

É interessante notar como os brasileiros ficam felizes com declarações como as do pré-candidato Republicano às eleições dos EUA, John McCain, segundo o qual “nosso [EUA] governo paga para subsidiar o etanol de milho e, ao mesmo tempo, cobra tarifas que impedem os consumidores de se beneficiar de outros tipos de etanol, como o do Brasil”.

Numa leitura mais rápida, parece que McCain demostra interesse pelo produto brasileiro e por condições produtivas mais igualitárias entre todos os produtores mundiais de etanol. Remover barreiras e retirar subsídios são efetivamente temas caros para os produtores brasileiros de etanol, mas a questão é saber se também o são para o Brasil. McCain não defende essas ações porque gosta do Brasil ou porque está preocupado com o meio ambiente. Bem ao contrário, ele está representando interesses reais de grupos norte-americanos.

O discurso de McCain não é voltado para o Brasil, mas para os eleitores norte-americanos. Desta forma, não temos que isolar os discursos e ficarmos felizes em ver esse apoio, bem ao contrário, precisamos compreender o que estão escutando os eleitores norte-americanos. E não só eles, a própria estrutura política dos EUA, incluindo aqui senadores e deputados.

É importante mantermos em mente que será muito mais difícil para McCain retirar os subsídios do que para Obama mantê-los e, até mesmo, aumentá-los. Os consumidores norte-americanos têm um retorno muito pequeno e difuso no caso de suspensão de subsídios, na medida em que os preços finais dos combustíveis sofrerão uma alteração marginalmente muito pequena. Por outro lado, a remoção de subsídios afetará diretamente um conjunto de produtores, que terão muitos incentivos para mobilização e defesa de seus interesses.

Neste cenário, enquanto a questão do etanol não tende a trazer uma grande quantidade de eleitores para McCain, a defesa dos subsídios por Obama é capaz de atrair grandes produtores de milho nos EUA, o que pode ser traduzido por grandes chances de captação de recursos para as campanhas.

Assim, enquanto no Brasil mascaramos a idéia de que o etanol é um produto e, portanto, está diretamente relacionado com grupos de interesse identificáveis, tratando-o como uma questão de interesse nacional, nos Estados Unidos Obama abertamente o encara como um produto e não teme em falar em nome dos produtores, ganhando em realismo político e capacidade de articulação com as classes políticas norte-americanas.

 

Publicado originalmente em Revista Autor (julho de 2008)

http://revistaautor.com/index.php?option=com_content&task=view&id=199&Itemid=1