Poucas coisas revelam tanto sobre um líder quanto a forma como ele lida com a própria sucessão. Líderes maduros entendem que preparar novas lideranças é parte essencial da sua missão. Já os inseguros — especialmente os que deixaram o ego ocupar o centro da gestão — evitam, retardam ou sabotam esse processo. Para eles, a sucessão representa uma ameaça direta: à sua importância, ao seu legado, à imagem que construíram.
Já testemunhei esse comportamento diversas vezes. Quando alguém da equipe começa a se destacar, não há incentivo — há silêncio. Quando surge uma ideia potente que não passou pela liderança, ela é descartada ou apropriada. Quando se fala em preparar o time para decisões estratégicas, a resposta é evasiva. É como se planejar a sucessão fosse admitir a própria mortalidade profissional.
“É somente sendo verdadeiramente nós mesmos que conseguimos nos conectar com o outro.” Donald Winnicott
Winnicott, ao explorar o conceito de falso self, nos ajuda a entender a raiz dessa dinâmica. Alguns líderes constroem uma persona que parece forte, visionária, indispensável — mas, por trás dela, há um medo profundo de não ser suficiente sem o cargo que ocupam. Essa identidade profissional artificial precisa se manter no centro a qualquer custo. E o custo, muitas vezes, é a renovação da organização.
Para os liderados, a consequência é um ciclo de estagnação. Os talentos não são desenvolvidos, a autonomia é podada, as oportunidades são escassas e, o que é mais grave, a cultura passa a girar em torno da preservação de uma única figura. Isso engessa a inovação e retém a energia criativa que deveria circular livremente por toda a estrutura.
Mas é possível crescer mesmo nesse cenário — embora o caminho seja mais tortuoso. A primeira atitude é não esperar pelo “padrinho” que vai impulsionar sua carreira. Se a liderança direta evita preparar sucessores, cabe ao profissional buscar outras formas de se desenvolver: mentorias fora da estrutura formal, cursos estratégicos, envolvimento em projetos transversais.
Outro ponto é entender o que essa resistência à sucessão revela sobre o líder — e o que ela pode ensinar sobre você. Às vezes, conviver com alguém que impede o crescimento alheio pode nos dar uma clareza brutal sobre o tipo de liderança que não queremos exercer. Essa experiência, ainda que frustrante, tem um valor formativo.
Também é importante visibilizar suas entregas de maneira inteligente. Não para rivalizar com a liderança, mas para garantir que sua trajetória não fique invisível. Registre conquistas, compartilhe aprendizados, construa uma reputação de consistência. Líderes passam — mas a credibilidade profissional permanece.
Preparar substitutos não é abrir mão do poder — é expandi-lo. Mas nem todos conseguem enxergar isso. Quando o ego ocupa a cadeira da liderança, a sucessão vira ameaça. E, nesses casos, a força do liderado está em crescer mesmo sem autorização, e em não esquecer o essencial: o verdadeiro poder não está em permanecer no topo, mas em multiplicar caminhos para os outros chegarem lá também.