Porque não quero ser deputado

05/09/2011 0 Por Rodrigo Cintra

Em 2006 Jaqueline Roriz foi gravada recebendo dinheiro de corrupção do esquema que ficou conhecido por “mensalão do DEM”, em Brasília. O vídeo que revela a ação foi divulgada apenas no começo de 2011, quando então Jaqueline Roriz já era deputada federal.

Diante disto, foi pedido ao Conselho de Ética (sic!!!) da Câmara a abertura de investigação, tendo por resultado a indicação de cassação da parlamentar por 11 deputados, contra 3 que a defenderam. Em seguida o processo foi encaminhado à Plenária. Dia 30 de agosto a Câmara dos Deputados do Brasil absolveu a deputada.

Protegidos pelo voto secreto, 265 deputados federais foram favoráveis à deputada, outros 20 se abstiveram da votação e apenas 166 foram favoráveis à cassação. Não bastando os resultados, se acompanharmos como foi a seção, a questão fica ainda mais grave. Os manifestantes que estavam nas ruas, lavando calçadas e espalhando faixas pela capital federal não tiveram qualquer relevância. Dos 310 deputados que estavam com presença registrada na seção, aproximada 100 eram os que efetivamente estavam no plenário durante a apresentação do relator.

Os poucos que tiveram coragem de falar à favor da deputada se limitaram a afirmar que o caso ocorreu antes do mandato, de forma que não pode ser levado em consideração. A própria deputada se limitou a dizer que a culpa é da mídia, que “devora a honra de qualquer pessoa”. Defende que tudo não passou de uma luta política para acabar com seu mandato.

O que esta caso mostra já vem sendo apontado nos mais diversos lugares: descaso com a opinião pública, descaso com o poder público, falta de ética, de respeito, de valores. As lutas políticas, os interesses e posicionamentos não são mais do que um conjunto de ações para proteger uma minoria de pessoas que conseguiram chegar ao poder. O que vale é a manutenção pela manutenção.

O que todos parecem ignorar é que a deputada Jaqueline só chegou onde chegou, porque tem uma atuação anterior. É verdade que o caso ocorreu antes de ela ser eleita deputada federal, mas sua carreira não. Os votos conquistados, o apoio que recebeu de seus eleitores (iludidos?), o apoio dos financiadores de campanha, tudo isso se deve a uma história maior. O fato ocorrido no passado é que traz ao presente.

Pior, o fato passado, protegido no presente, terá grandes impactos no futuro. Mas nada disso é levado em consideração. Não tem problema, a política é assim, já se distanciou de tudo. Projeto de país não é algo relevante, ou mesmo lembrado pela classe política atual. O que importa é entrar no esquema, conseguir o que puder e depois colocar a culpa de tudo nos opositores, naqueles que só estão buscando a desestabilização do governo. Ou não é isso que aconteceu com a sequência de ministros que caíram logo no começo do governo Dilma.

O resultado mais profundo e nefasto de tudo isso é a morte da política. Pelo menos política como projeto, como diálogo, como espaço para a construção de um país melhor. Sobrou a politicalha, as negociatas baixas. No fim, a política vira espaço para aqueles que não deveriam estar lá. Os de boa índole, capazes de pensar um pouco na coletividade nacional, capazes de ceder um pouco de seu esforço por algo maior, não querem ir para a política. Não há espaço. Não há condições. Não há tesão!

Por que eu não quero ser deputado federal? Porque ainda sonho com um país melhor. Porque ainda acho que podemos encontrar caminhos para construir um país melhor. Por que eu não quero ser um deputado federal? Porque eu só acredito hoje na sociedade civil. Se querem mesmo saber minha opinião, no momento o melhor é terceirizarmos o Estado brasileiro para alguma multinacional. Absurdo? De quem, o meu ou o da classe política?

Publicado originalmente em Revista Autor – 01/09/2011

http://revistaautor.com/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=702:porque-nao-quero-ser-deputado&catid=20:polca&Itemid=39