As eleições municipais e a corrida presidencial no Brasil

01/02/2008 0 Por Rodrigo Cintra
A política brasileira retoma aos poucos os trabalhos, depois das tradicionais férias de final de ano. No entanto, esse ano a política será um pouco diferente daquela que se viu em 2007. Esse ano, mais do que ações concretas por parte dos governantes, veremos o começo de um ciclo eleitoral que começa com as eleições de 2008, para os governos municipais, e só acaba em 2010, com as eleições presidenciais.

A política brasileira retoma aos poucos os trabalhos, depois das tradicionais férias de final de ano. No entanto, esse ano a política será um pouco diferente daquela que se viu em 2007. Esse ano, mais do que ações concretas por parte dos governantes, veremos o começo de um ciclo eleitoral que começa com as eleições de 2008, para os governos municipais, e só acaba em 2010, com as eleições presidenciais.

As eleições locais desse ano serão relativamente atípicas em função dos preparativos e articulações políticas para as eleições de 2010. Assim, por um lado haverá a tendência já natural de expressões políticas que buscam os extremos: a ultra-exposição midiática (para os casos de escândalos) e a política de bastidores (para os casos de ações voltadas às eleições e suas articulações). Por outro lado, o fim do segundo e último mandato do presidente Lula abre espaço para uma forte luta por possíveis substitutos.

Em última instância, é possível dizer que a corrida presidencial já começou no Brasil e isso deve apresentar fortes impactos nas políticas locais. Muito do que ocorrer no nível municipal já será uma amostra das tendências que dominarão o cenário político brasileiro até as eleições presidenciais e, por conseqüência, é uma indicação das possibilidades de cenários políticos para o Brasil do pós-2010.

O estado de São Paulo apresenta-se como o maior colégio eleitoral brasileiro, ganhando em destaque e capacidade de projeção (basta lembrarmos que tanto Fernando Henrique quanto Lula, os dois últimos presidentes do Brasil, chegaram à presidência projetados por São Paulo). Ao mesmo tempo, a cidade de São Paulo é igualmente importante já que concentra uma grande quantidade de eleitores e de contribuintes eleitorais (esse é especialmente o caso de doadores pessoas jurídicas, ou seja, empresas).

Apresento a seguir alguns cenários que hoje começam a se desenhar para os principais partidos/candidatos na cidade de São Paulo, algo que pode ser comparado às primárias norte-americanas no sentido de se apresentar como um termômetro das vontades populares e dos ventos políticos.

 

Democratas (DEM)

Os Democratas estão hoje na prefeitura, com o prefeito Gilberto Kassab, e começam a vislumbrar novas possibilidades. Kassab, vice-prefeito de José Serra (PSDB), assumiu a prefeitura quando este saiu para concorrer e, logo em seguida, assumir o governo do estado. Naquele momento não havia cenários para re-eleição já que o novo-prefeito era um desconhecido entre o eleitorado. Com o passar do tempo, Kassab se sentiu mais à vontade na prefeitura e ensaiou vôos maiores, não se limitando a ser apenas uma figura de transição (como ocorreu no caso de Cláudio Lembo com Geraldo Alckmin no governo do estado).

A direita quase reacionária, que normalmente sustenta os Democratas em outros lugares, no caso de São Paulo já está tomada pelo Partido Progressista, não permitindo uma projeção mais forte do prefeito Kassab junto ao eleitorado. Assim, se por um lado Kassab quer tentar a re-eleição, por outro sabe da necessidade imperiosa de se unir a um partido mais forte para que tenha chances reais.

A questão é que PT, PMDB e PSDB estão envolvidos em outros jogos políticos, vislumbrando o as eleições presidenciais de 2010, de forma que os Democratas deverão ficar isolados nessa eleição repetindo, aliás, o que já tem acontecido em nível federal.

Até o momento, na medida em que os DEM devem lançar Kassab e esse apresenta poucas chances de ganhar (cenário que só se altera com o apoio explícito de Serra e do PSDB), é esperado um enfraquecimento ainda maior dos DEM em níveis político-eleitorais.

 

Partido dos Trabalhadores (PT)

Recentemente a atual ministra do Turismo Marta Suplicy (PT, o mesmo partido do presidente Lula) anunciou que sairia candidata à prefeitura. Dentro do PT parece um dos nomes mais fortes e consolidados e, aparentemente, apresenta chances reais de ganhar. Ainda que tenha sido derrotada quando tentava se re-eleger, por enquanto o cenário lhe parece bem favorável.

Se o outro candidato for o atual prefeito, Gilberto Kassab (DEM), suas chances são muito grandes. Porém, há que se notar que o PSDB já deixa claro que vai esperar a oficialização de sua candidatura para decidir se continua a apoiar Kassab ou se vai lançar Geraldo Alckmin (PSDB). No momento, o principal objetivo do PSDB é garantir que o governo da cidade de São Paulo fique nas mãos de um partido aliado, quando não puder ficar nas mãos do próprio PSDB.

Recentemente o PT perdeu parte da sua capacidade de influência no Congresso, como bem demonstra a perda da aprovação da renovação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que em 2007 foi responsável pela arrecadação de aproximados R$ 37 bilhões. Outro sinal de abertura de negociações é o recém-empossamento do ministro de Minas e Energias Edison Lobão (PMDB), a despeito de todas as acusações de corrupção que pesam sobre seu filho.

Nesse cenário, a prefeitura de São Paulo se apresenta como um importante elemento para projeção eleitoral, podendo fortalecer a capacidade de projeção do PT no maior colégio eleitoral do país. Assim, caso Marta Suplicy consiga ganhar as eleições municipais, será capaz de se lançar num segundo momento à presidência, ou mesmo fortalecer outro candidato que o PT venha a lançar.

Por outro lado, uma candidatura Marta, especialmente se for polarizada com uma candidatura PSDB, poderá se transformar numa exposição do PT como um todo. A depender do desenvolvimento das campanhas e debates, a candidatura poderá trazer muitos desgastes ao PT, e prejudicar o partido nas eleições de 2010, especialmente caso Marta perca.

 

Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB)

Um dos principais candidatos do PSDB à presidência é José Serra, que disputou de forma velada com Alckmin a indicação do PSDB para a presidência nas eleições que elegeram Lula. Para que Serra se fortaleça em São Paulo, é importante que o atual prefeito da cidade Gilberto Kassab (DEM) seja reeleito. Assim, além de manter o possível candidato à prefeitura Geraldo Alckmim (PSDB) fora do foco da opinião pública, ainda possibilita a articulação entre os Democratas. Isso ocorreria sobretudo em função da capacidade que Serra tem de ainda influenciar na prefeitura de São Paulo no mandado de seu vice-prefeito, Kassab.

O ex-prefeito e atual governador José Serra tem se mostrado cada vez mais explicitamente favorável à candidatura (re-eleição) de Kassab. Para Serra melhor é continuar com Kassab do que ter Alckmin (PSDB), ainda que seja do mesmo partido, não está em convergência total com Serra. O pior cenário, para Serra, seria ter Marta Suplicy (PT).

Por outro lado, na lógica partidária, caso Alckmin não saia, será um natural candidato à presidência ou, o que é possível, ao governo do estado. Essa parece ser a estratégia que poderia oferecer uma maior estabilidade interna ao partido, Alckmin não sairia candidato à prefeitura, deixando espaço para o fortalecimento de Serra. Num segundo momento, Serra sairia candidato à presidência, e em troca oferecia a Alckmin o apoio para que este saísse para o governo do estado. Em última instância, isso significaria o adiamento dos projetos de Alckmin para a presidência e conseguiria unificar em torno de um projeto partidário mais amplo algumas das mais importantes lideranças eleitorais do PSDB.

Destaca-se apenas que esse cenário ainda é dependente da força que a candidatura de Marta Suplicy (PT) conseguir, que pode forçar a entrada de Alckmin na corrida pela prefeitura de São Paulo.

 

Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB)

Está numa posição muito confortável em São Paulo, sendo parceiro fundamental em qualquer coligação que queira chegar à prefeitura. Dessa forma, como já é tradicional no PMDB, a tendência é não sair com candidato próprio, esperando o parceiro (PT ou PSDB) que mais oferecer em troca do apoio, tanto no caso específico da prefeitura de São Paulo, quanto de uma parceria maior, que dure até as eleições presidenciais de 2010.

Nas palavras de uma importante liderança local do partido, o deputado Michel Temer (PMDB/SP): “Dificilmente teremos candidato. E somos uma força significativa. Nossa perspectiva mais sólida é mesmo a de fazer uma aliança”.

Pessoas ligadas ao PT e à Marta Suplicy (PT) já iniciaram conversas com o partido, enquanto que Geraldo Alckmin (PSDB) também conversa com o partido, se aproximando do presidente estadual do PMDB, Orestes Quércia. Certamente o peso eleitoral do PMDB será decisivo para qualquer uma candidatura de sucesso à prefeitura de São Paulo, de forma que PT e PSDB deverão se esforçar ao máximo para conseguir o apoio. Até o momento, o novo ministério oferecido a Edison Lobão (PMDB) conta como uma importante moeda de troca oferecida pelo PT.

 

Dessa forma, por enquanto é possível dizer que há uma maior tendência de aproximação entre o PMDB e o PT, o que fortalece as possibilidades da projeção de uma possível coligação entre ambos para a presidência em 2010. Se isso ocorrer, o PSDB ficará ainda mais fragilizado e distante do poder. No caso dessa tendência se consolidar, espera-se que o Brasil pós-2010 seja governado por uma replicação do atual governo. Certamente o carisma do presidente Lula não será uma marca presente, de forma que se espera um aprofundamento de uma dinâmica política menos estratégica e mais cotidiana, com suas trocas e ações destinadas ao atendimento individual dos parlamentares – lógica, aliás, bastante presente tanto no PT quanto no PMDB.

Fonte: http://revistaautor.com/index.php?option=com_content&task=view&id=77&Itemid=48